Nunca fui requintada, e quase sempre
abrutalhada, mas queria inserir-me no grupo das raparigas finas e polidas.
Gostava de calçar saltos altos, para parecer mais alta e esguia, pôr umas
pinturinhas no rosto, um batom para colorir os lábios, rimel para dar aquele destaque
aos olhos... Cheguei a fazer nuances (ou
madeixas) para dar mais brilho ao cabelo... Perfume também usei, para cheirar bem e tornar a minha presença uma experiência agradavelmente
deliciosa a quem se aproximasse. Enfim, uns toques de cosmética para mascarar
quem eu realmente sou.
Um dia, a maternidade trouxe-me o
confronto com a minha verdade nua e crua.
Agora não havia tempo nem vontade para maquilhagens nem perfumes.
Não havia disposição para saltos altos e arriscar a cair com um bebé sempre em braços.
Não queria perturbar com cheiros artificiais nem produtos sintéticos aquele ser
amado.
Muitas vezes nem havia tempo para banho e o cheiro a bolsado era o
meu companheiro habitual que não me deixava esquecer a minha condição de mãe recente. Os
cabelos passaram a andar presos num rabo de cavalo mal amanhado, com pasta de
bolsado nas pontas e a cheirar a azedo.
A convivência com esta nova realidade operou uma transformação em mim.
Hoje, passados 5 anos, já não uso saltos altos, nem perfume, nem
máscaras visíveis. As invisíveis às vezes ainda teimam em aparecer!
Agora, gosto do meu cheiro! Já com direito a banho mais frequente
e sem o característico cheiro a azedo dos primeiros meses. Às vezes ainda aprendendo e me surpreendendo com alguns aromas menos desejáveis (socialmente falando, pois claro!)....
Gosto dos meus cabelos grisalhos, madeixas naturais que emolduram
o rosto, e que as algumas outras mulheres teimam em querer que eu esconda.
Hoje sinto-me incomodada com o cheiro a químicos de perfumes
sintéticos e amaciadores de roupa…
Hoje, gosto do cheiro a gente!
Gosto do cheiro a gente limpa, a gente lavada com sabão natural.
Gosto do cheiro a pele lavada.
Gosto do cheiro a gente, gente humana, gente que cheira a gente e me
lembra que somos todos gente da mesma raça, da mesma natureza, filhos da mesma Terra.
Gosto do cheiro a pessoas, pronto!
Serei estranha?
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